Sidclei Nagasawa Costa
Literatura e Esportes
quinta-feira, 31 de maio de 2018
segunda-feira, 30 de maio de 2016
CADARÇOS
Cheguei
nesta cidade há oito anos, vim de uma cidade bem pequena, 15 mil
habitantes. Quando passei no vestibular, universidade pública, foi
uma festa enorme, educação física.
–
Quando terminar o curso, só não pegue aula no Colégio Jardim
Caiçara – diziam assim que cheguei.
Aquela
escola devia ser o inferno! Contavam histórias de professores
ameaçados em sala de aula, de tráfico de drogas enquanto as aulas
“rolavam”… Tudo me assustava muito.
Estudei
minha vida toda em escola pública, e muito carente, mas não era
violenta, o professor para nós era autoridade máxima, merecia todo
o respeito.
Chamaram-me
para pegar minhas primeiras aulas, só tinha uma coisa na minha
cabeça: tudo menos o Jardim Caiçara. Para minha felicidade, as
aulas que me deram era na escola Maria de Liz Pinheiro.
Entrei
toda feliz na escola para assumir minhas aulas, a diretora mal olhou
na minha cara e me encaminhou a uma mulher chamada Célia, que me
mostrou a escola e como tudo funcionava por ali..
–
Tirou a sorte grande! Está no céu. Todo mundo sonha trabalhar lá.
– disse Mayara, minha amiga que dividia o apartamento comigo,
quando contei a ela.
Na
manhã seguinte, cheguei toda sorridente para, enfim, assumir minhas
primeiras aulas. Alunos comportados, mas poucos realmente se
interessavam por algum esporte. No intervalo, nosso lanche era bom,
por chegar atrasada, não havia um lugar para sentar. Tomei meu
lanche no cantinho, solitária.
As
aulas iam bem, meus alunos não me davam trabalho, tinha que insistir
com muitos para que participasse das atividades esportivas. Com o
tempo, descobri que os professores tinham lugar marcado nas mesas,
havia uma hierarquia, eu teria que esperar algum tempo para
conquistar um lugarzinho no cantinho, mas estava bom para mim. Estava
começando, ótimo!
Passaram-se
4 anos, trabalhei em várias escolas desta cidade e, por sorte,
jamais sobrou o Jardim Caiçara para mim.
No
ano passado passei no concurso público, 2º lugar. Há um mês fui
assumir. Cheguei toda feliz para a escolha. Fui a segunda a ser
chamada, eram 22 professores. Olhei todas as escolas que tinham aulas
disponíveis e não tive dúvidas.
–
Quero o Jardim Caiçara.
Achavam
que escolhera aquela escola por falta de opção, diziam que eu era
louca. Ninguém entendia meus motivos.
Fui
muito bem aceita na nova escola, por toda a equipe. Já na sala de
aula, não foi tão fácil, muitos alunos indisciplinados, mas era só
levá-los para a quadra que a coisa mudava, fiquei encantada com a
forma como gostavam de esportes. O único problema é quando dava
confusão, uma entrada mais forte, uma reclamação. Xingavam-se,
ameaçavam se acertarem no braço, porém sempre conseguia contornar
a situação.
Em
minha primeira aula no 6º C, percebi que havia um menino que não
participava da aula. Estava sentado, solitário. Chamei-o, não
respondeu. Gritei!
–
Professora, o Emanuel é surdo! - gritaram os alunos.
Fiquei
envergonhada e me dirigi ao menino. Usei um pouco da Libras que
aprendera e consegui me comunicar com ele. O menino não aceitou
participar.
Procurei
saber quem era o menino; pai e mãe presos por tráfico; criado pela
avó materna, uma senhora idosa; era comum faltar na escola.
Na
minha terceira aula com a turma, Emanuel aceitou participar da
atividade esportiva. Estava correndo quando pisou no cadarço e caiu. Corri preocupada. Peguei-o no colo e o carreguei.
Por sorte, foi só um susto, amarrei seu cadarço e beijei-o na
testa. Pensei: “Nunca mais vai participar.”
Na
aula seguinte, lá estava ele eufórico, entrou em quadra e, em seu
primeiro pique, percebi que seus cadarços estavam desamarrados,
interrompi o jogo e os amarrei. Beijei novamente sua testa.
Na
vez seguinte em que estava com os cadarços desamarrados, perguntei a
ele se não sabia os amarrar, respondeu-me que não. Tentei ensiná-lo,
mas parecia uma tarefa impossível para ele, desisti.
Na
segunda-feira, após amarrar seus cadarços, ele se levantou, beijou minha
testa e me abraçou. Na saída, Emanuel estava caminhando, de
repente, abaixou-se e amarrou os cadarços com destreza. “Ele me
enganou!”
Desde
que comecei a trabalhar no Caiçara, hoje foi a primeira vez que o
menino faltou. Quando saía da escola, fiquei sabendo o motivo. A mãe
saíra da prisão na semana passada. Durante a última madrugada, a
casa foi alvejada por diversos tiros. Ela está morta e Emanuel
acabou levando um tiro e corria risco de morte.
Deixei
meu almoço para depois e fui correndo ao hospital. Não queriam me
deixar entrar, insisti, contei várias histórias e, após muitas
recomendações, deixaram-me.
O
menino estava imóvel quando entrei no quarto. Sentei-me ao seu lado
e perguntei:
–
Emanuel, o que fizeram com você?
Ele
permaneceu imóvel por muito tempo. Continuei conversando, nem sei ao
certo o que dizia, só sei que, logo após ficar calada, o menino
mexeu o braço direito.
–
Fique quieto, Emanuel! Não gaste energia, precisa dela.
Ele
continuou mexendo o braço direito até conseguir pegar na ponta do
lençol que o cobria, logo abaixo do pescoço. Parou por alguns
instantes, fiquei aliviada, entretanto, logo em seguida, fez um movimento
brusco, descobrindo boa parte de seu corpo. Só então percebi o que
queria. Peguei o lençol e, com muito carinho, cobri-o novamente,
abracei-o com cuidado e beijei sua testa. Nesse momento não aguentei
e me desfiz em lágrimas, foi dessa forma que deixei o hospital.
Minha
tarde foi triste, no entanto acreditava na recuperação do menino.
Há pouco meu celular tocou. É muito triste saber que nunca mais vou
amarrar seus cadarços.
sábado, 28 de novembro de 2015
segunda-feira, 16 de novembro de 2015
quinta-feira, 29 de outubro de 2015
MORIMUNDO
O
mundo acordou tão triste
E
todos correram acudir
Trouxeram chás e remédios,
O melhor médico
Deitaram-no em felpudo colchão
Presentearam-no com ouro e diamantes
Oferendas vieram aos montes.
Trouxeram chás e remédios,
O melhor médico
Deitaram-no em felpudo colchão
Presentearam-no com ouro e diamantes
Oferendas vieram aos montes.
Um menino olhava distante
Nada tinha a oferecer
Quando o guardião descuidou
O mundo abraçou
Viveu apenas mais alguns instantes
E se foi feliz
O mundo.
segunda-feira, 19 de outubro de 2015
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