Há
quinze anos, fui morar em um país distante. A vida era muito difícil
lá, muito desemprego e desigualdade social.
Álvaro
foi uma das pessoas que conheci, estudamos juntos. Fiz algumas
amizades por lá, mas ele não passou de um colega de sala. Tínhamos
18 anos, ele era o único de toda a turma que andava motorizado,
tinha uma moto, presente do pai. O pai de Álvaro era um empresário
conhecido e, assim que o filho completara 18, deu-lhe o veículo.
Nas
poucas conversas que tive com o rapaz, ele sempre deixava claro que
seu sonho era ter um carrão. Naquela época, pouquíssimos tinham
carro, o pai dele era um.
Não
aguentei ficar mais que um ano e voltei para o meu país. Aquele país
me deixava muito triste, pensei em nunca mais voltar.
Já
faz alguns anos que soube que a situação do país melhorou muito,
principalmente quanto à desigualdade social. Decidi voltar a
passeio. E aqui estou.
As
ruas estão realmente muito diferentes, não vejo mais filas de
empregos, vejo raros mendigos, quase não há crianças esmolando,
mercados movimentadíssimos…
Hoje,
enquanto passeava na praça central, avistei um homem descendo de um
carro caríssimo. Notei que era Álvaro. Fui falar com ele. Não me
reconheceu, mesmo assim lhe parabenizei:
–
Parabéns! Vejo que conseguiu realizar seu sonho.
–
Sonho?
–
Sim, você dizia que o seu sonho era ter um carrão. Hoje você tem.
–
Grande merda! Qual a graça de ter um carrão quando todos podem ter
um bom carro?
Deixou-me
ali parado. Continuei meu passeio pela – agora – bela
cidade. “Ainda bem que em meu país não há pessoas que pensam
como Álvaro.”