– Você já viu aquele
vizinho novo?
– Aquele que mora no
térreo!
– Que cara esquisito!
Vi hoje pela primeira vez.
– Não, eu nunca tinha
visto... Só ouvia a bagunça dele.
– É, ele é menos
barulhento que a piriguete que morava lá, mas...
– Sim, eu sei, já
estou até arrependida de ter feito ela ser expulsa do prédio. Era
bem melhor ver aquele monte de homens entrando e saindo do que ouvir
essas músicas do satanás.
– Como ele é? Cheio
de tatuagens. Cabeludo. Se fosse mulher, aquele cabelo ficaria lindo,
mas homem com um cabelo daqueles! Tem mais, Otirípse, roupa toda
preta e na camiseta o desenho de uma caveira.
– Não sei a diferença
entre caveira e zumbi, mas é verdade, tinha cabelo e usava roupa.
Acho que ele não sai do cemitério.
– Otirípse! Pode ser
que ele seja daquelas religiões que matam e fazer sacrifício com os
órgãos. Precisamos fazer alguma coisa!
– Agora entendo tudo!
Agora entendo! Por isso que ele foi tão generoso comigo quando
cheguei. Eu carregava duas sacolas, ele disse bom dia, nem respondi,
mesmo assim teve a coragem de abrir a porta do elevador para mim. Fiz
de conta que nem vi. Não dou confiança. Se faz de santo só para me
conquistar. Ele quer meus órgãos. Conheço essa raça! Não me
enrolam! Conheço bem!
– Precisamos dar um
jeito dele sair daqui!
– A Jasmine disse que
ele é professor. Professor? No meu tempo, professor ensinava, não
andava dando mau exemplo. Professor cabeludo não pode. Professor tem
que ouvir música clássica, não gritaria. Por isso que o Bruninho
andava ouvindo essa porcaria de metal. Professor que ouve isso é má
influência.
– Sim, Otirípse, o
nosso neto, o Bruninho, se a gente não cuida, logo quer fazer
tatuagem, colocar “pice”.
– Meu Deus! O que é
isso? Vou chamar a polícia!
– Como não é nada
demais? Olhe lá! Está com as crianças!
– Brincando? Sei!
– Como assim sem
maldade? Não vê! Conquistando os pequenos para tirar proveito. Meu
Deus! Se for um pedófilo! Vou chamar a polícia! Esse criminoso não
pode andar solto por aí!
– Essa historinha de
brincar sem maldade não existe!
– Alô! É da polícia!